Faces – Pessoas do Parque

No Natal de 1997, de regresso a Madrid, cidade onde vivia e desempenhava a minha actividade profissional, fiz uma paragem no gigantesco estaleiro de obra que era toda a Zona de Intervenção da EXPO. Fiquei entusiasmado com o que vi, uma revolução em toda aquela zona degradada, pobre, suja, poluída, trabalhava-se para o aparecimento de uma nova área de habitação, comércio, lazer, com grandes avenidas, jardins, museus, teatros, cinemas, oceanário, marina, campos de ténis, de futebol, clubes de saúde (spa´s), centro comercial, hipermercados, comércio de proximidade, centro de saúde, escolas, etc., etc..
A atracção foi imediata e já só seguimos de viagem para Madrid após consumar o contrato de compra e venda da nossa futura casa em Lisboa.
Os meses que se seguiram foram de expectativa (desde Madrid) sobre o andamento dos trabalhos, os quais tinham como limite o mês de Abril de 1998, para a abertura oficial da EXPO 98.
Recordo como alguns amigos argumentavam que “nem a Expo abre a tempo, quanto mais o resto”, e chegados ao dia da inauguração foi com claro orgulho que assisti com a minha família e restantes amigos portugueses em Madrid, à abertura do que veio a ser a fantástica EXPO 98, elogiada por todos quantos a visitavam.
Regressámos a Portugal, no Verão de 1999, indo ocupar a nossa casa na Expo. Desde o início o ambiente foi o de uma aldeia, dentro da cidade, o comércio de bairro era de qualidade e de proximidade, o trato era feito (e continua a ser) pelo nome próprio do cliente ou do funcionário. Quase todos nos conhecíamos e era visível o prazer em viver neste espaço novo da cidade.
Tive algumas discussões com moradores ou visitas que, “à descarada” subiam os passeios para estacionar os carros à porta de casa (literalmente). Recordo o quão indignados ficavam quando lhes chamava a atenção para o facto dos passeios serem para os peões e as ruas para os carros. Contrapunham que faziam o que lhes apetecia, pois “a rua não era minha”.
Pacientemente e, às vezes, não tanto, tentava explicar o facto daqueles passeios e daquelas ruas, jardins, bancos, papeleiras, candeeiros públicos, etc., serem de facto também meus, pois para isso pagava os meus impostos e como tal tinha o dever e o direito de zelar pelo seu bom uso. O argumento contrário era o de que “isto”, a rua, não é de ninguém, portanto ele fazia o que muito bem entendesse e não admitia interferências na “sua vida privada”. O meu argumento era linear: “isto” como lhe chama não só não é de ninguém como é de todos, todo este espaço foi construído com o dinheiro dos nossos impostos, e é um espaço que é efectivamente de todos, para ser usufruído por todos, preservado por todos, é um Bem Público.
Este morador só percebeu que os passeios eram para os peões e não para os automóveis quando foram implantados os famosos pilaretes e ele teve que estacionar a sua viatura na rua e caminhar (ó esforço glorioso) uns míseros 5 metros até à porta de sua casa.
Esta história vem a propósito do que me parece ser essencial neste espaço que é o Parque das Nações. Um espaço novo desenhado para servir a população, com uma arquitectura moderna e ao mesmo tempo racional, com serviços, comércios, jardins, espaços de lazer onde a vida das pessoas facilmente sai para fora dos limites das suas casas, onde se podem ver grupos de vizinhos, confraternizando, grupos de miúdos brincando ao ar livre, usufruindo dos magníficos relvados existentes, onde, apesar dos tempos difíceis que vivemos (a sociedade em geral), os habitantes deste espaço convivem, desligam-se um pouco da prisão mental que é a televisão nos nosso dias, enfim, vive-se numa cidade como antes se vivia num bairro, numa vila ou numa aldeia, humanizou-se de novo a vida numa grande urbe, os vizinhos conhecem-se, quão importante é esta relação para nos respeitarmos e sermos respeitados nas nossas ideias e nas nossas diferenças.
Está tudo bem no Parque das Nações? Não, mas parece-me que é um espaço urbano que conseguiu criar e manter um invejável equilíbrio e um muito bom nível de qualidade de vida.
Falta o tão prometido Centro de Saúde, houve atrasos, na 2ª escola pública e só recentemente abriram três novos colégios privados, a Torre Vasco da Gama foi votada ao abandono durante demasiado tempo, a Marina esteve fechada e inactiva tempo de mais, algum estacionamento de superfície é caótico e pouco civilizado, especialmente na área central e sul, as mais pressionadas por visitantes do Parque, enfim, é sempre possível fazer mais e rectificar erros.
A chave da questão para mantermos a qualidade de vida deste espaço, parece-me estar no pensarmos mais no “nós” e menos no ”eu”, em privilegiarmos mais o “ser” do que o “ter”, vivermos e desfrutarmos desta magnífica viagem que é a vida, com prazer, educando os nossos filhos para que seja possível, todos e cada um de nós, legarmos um Mundo melhor para os nossos filhos e, tão ou mais importante, uns filhos melhores para o nosso Planeta.
E isto, sim, creio ser possível fazê-lo num espaço onde todos nos sentimos bem e como tal desejamos preservá-lo, vigiá-lo e defendê-lo.
Uma nota final para o imperativo da criação da freguesia do Parque das Nações, una e indivisível, que tenha uma gestão que possa preservar todo o trabalho desenvolvido anteriormente pela Parque Expo, na totalidade do que foi a Zona de Intervenção da EXPO e que possa avançar decisivamente para novas iniciativas com as várias organizações de cidadãos que já hoje são um exemplo de cidadania, a AMCPN – Associação de Moradores e Comerciantes do Parque das Nações, o CPN – Clube Parque das Nações e este nosso precioso bem que é o Notícias do Parque.