Aldeia Global

Luís Parro, partner da InCensya, trabalha desde 19991, na área dos eventos.  Logo muito cedo percebeu que o “fun” pode estar associado à acção social, transmitindo valor a um evento. Depois de uma operação com a organização do Nariz Vermelho surgiu o evento da Aldeia Global, que levou os funcionários da Siemens à Aldeia de Ponte do Rol recuperar, num dia, aquilo que estava previsto ser feito em 3 anos. Fica a conversa com os irmãos Luís e Paulo Parro sobre esta empresa 100% portuguesa de eventos de alto impacto e retorno mensurável.

Como surgiu o conceito da Aldeia Global?
Uma das perguntas que temos no site é: “Consegue contabilizar o bem-estar da sua empresa?” É algo que, ainda hoje, é intangível, que não aparece nos balancetes de uma empresa. A felicidade de uma empresa é algo que não se consegue contabilizar. Por muito que as empresas queiram atribuir um valor mensurável é impossível medir esse bem-estar. O que nós fazemos é um processo de transformação de tangYvalue em que conseguimos medir o impacto do bem-estar, da felicidade na produtividade. Esta é a ferramenta de tangYvalue que é a base da Aldeia Global, que nasceu da necessidade de transmitir valor a um evento. Não só reunir as pessoas a divertirem-se numa celebração em torno da empresa, da marca, mas acrescentar valor, deixando algo de importante para o futuro. O conceito é mudar Portugal aldeia a aldeia. Temos essa convicção, sabemos que é ambiciosa, mas é esse o nosso caminho.

Como fazem a escolha da aldeia?
Depois da acção da Aldeia Global já temos sido contactados por autarquias que querem desenvolver esse tipo de acções.  Por outro lado, nós também andamos atentos, falamos com as pessoas e sabemos o que se passa. A ideia passa por sugerirmos ao nosso cliente/sponser várias aldeias. Depois de escolhida, passamos por um processo de identificação de necessidades de forma a que  se possa fazer uma intervenção holística. Não só o pintar a escola, a Igreja, o centro de dia, mas tudo aquilo que identificámos como necessidades: casas particulares, etc… Tudo isto com uma componente muito forte de partilha de cultura. Não só o dar, mas o receber a história local, a gastronomia, o lado humano. Todos aqueles aspectos importantes e que estão na razão que já nos levou de volta a Ponte do Rol porque se criaram laços, nesse primeiro contacto.
Esse é um dos pressupostos de cada projecto: que a intervenção não fique degradada pelo tempo. É preciso ter valor real na aldeia. Depois, porque se trata de uma abordagem muito humana, olhos nos olhos,  o lado humano é muito importante.

Não deve ter sido fácil pôr em prática o projecto…
A concretização foi naturalmente complexa porque tínhamos 4 horas para 11 intervenções as quais tinham que ficar concluídas. Colocámos chão em casas particulares, mudámos janelas, cortámos sebes, pintámos muros, mudámos o chão da escola, enfim, foi uma intervenção onde se procurou acrescentar valor e não simplesmente “chegar e pintar”. Não é só isso que depois vai interferir na vida das pessoas. Por exemplo, o Centro de Dia foi pintado, mas teve, também, um chão antiderrapante e aquecido, teve nova iluminação, novos cadeirões, teve uma parede com uma fotografia de uma floresta. Teve todos esses pormenores que vão além do dar nas vistas, teve algo com valor e que ficou naquela terra. E todos sentiram isso. Por outro lado não levámos um único fornecedor nosso. Não levámos o nosso catering, os nossos técnicos.  Era tudo da região. O cuidado em desenvolver o comércio local foi um dos princípios básicos da proposta.

Qual foi a reacção das pessoas?
No final do dia as pessoas vinham agradecer com lágrimas nos olhos. Foi muito forte.
Outro aspecto interessante foi que chegou a uma altura em que se perdeu (no bom sentido) o controlo dos acontecimentos. E era, também, isso que queríamos. Entregar à aldeia, entregar à Siemens o resto da história. Que as pessoas, ao criarem aqueles laços relacionais, fizessem o resto da história.

De que modo foi feita a pré-produção?
Nós fomos apenas interlocutores. A equipa organizacional era nossa. Pedreiros, marceneiros, o material utilizado era tudo de origem local. Grande parte das lojas forneceu o material a preço de custo e ofereceram mão de obra. As próprias senhoras trataram de trazer doces e bolos. Tínhamos uma equipa nossa para organizar e fazer o interface com as entidades locais. O nosso parceiro local era o ASAS, Associação de Solidariedade de Acção Social, que como tem como missão o serviço domiciliário conhece as casas das pessoas e as suas principais carências. E foi por aí que começámos a fazer essa primeira abordagem, esse primeiro sentir das necessidades da aldeia. Depois a Paróquia, a Junta de Freguesia e a Câmara Municipal de Torres Vedras juntaram-se à iniciativa.

Como foi observar tudo a acontecer?
Quando se criou aquela dinâmica, toda aquela dimensão humana… Só de pensar no Zé Luís e no filho que viviam num quarto onde escorria água da chuva pela parede interior e que tinha um buraco com dois metros de profundidade, mesmo ao lado da cama dele… Face a isto, claro que a obra é importante porque influenciou muito a vida das pessoas, mas o lado humano foi fundamental. Foi gratificante. Foi muito além daquilo que imaginámos.
Estamos a falar de 350 pessoas.  Foram 4 horas de intervenção de manhã, almoço comunitário, à tarde jogos com a Siemens e as pessoas locais. Discoteca ao ar livre e, para terminar, um espectáculo final. A carga energética da parte da manhã potenciou todo o convívio durante a tarde. Sem isso teria sido mais um dia de festa.

Fica muito caro para uma empresa um evento deste género?
É claramente uma solução anti-crise. Estão cá todas as plataformas de fun que qualquer evento pode ter. A intervenção social é uma rubrica à parte. Fazemos o levantamento das necessidades da aldeia e entregamos essa listagem ao cliente que escolhe as intervenções que quer fazer. O que acontece normalmente é que quando se apercebe do conjunto de necessidades envolve-se bastante com o projecto. Fica sensibilizado. Depois decide o tipo de donativo que quer dar. Um donativo tem uma majoração de 140%. Ou seja, o valor integral que é dado como donativo é benefício fiscal. Mais 40 % desse valor que vai buscar à outra parcela que é um custo da organização. Portanto aqui já há uma vantagem em termos fiscais e em torno do custo da operação. Depois, no caso da Siemens, todo o trabalho de equipa que foi feito durante a manhã, foi acompanhado por um parceiro da área da formação onde foram passados um conjunto de valores de trabalho de equipa, de gestão de esforço, o que é contabilizado, também.  Portanto teve um conteúdo formativo, teve a acção social e depois tem o valor da marca que é divulgado na comunicação social. Na verdade acaba por ser bem mais barato do que é habitual.
Depois, o orgulho de pertença àquela marca, de a representar é extraordinário. E isso tem um valor brutal. Não falando na exposição mediática, para a marca, mas pelo lado nobre, existe uma outra sensibilidade porque, mesmo neste momento de crise, a empresa que mais der é a empresa que mais beneficia. Se uma empresa gastar muito dinheiro com um simples evento, pode ser criticada por isso. Neste caso está a dar algo. Portanto, quanto mais der melhor. Hoje em dia já é muito difícil dizer: “Eu fiz isto!” Os nossos trabalhos são tanto nas áreas dos serviços que raramente vemos alguma obra feita. A marca que deixamos é muito importante.

E é um claro exemplo de win win. Ganha a empresa, ganha a aldeia. Ganha o interior.
Se conseguíssemos esta dinâmica acelerada, em que tivéssemos vários sponsors a ir, de aldeia em aldeia, imaginem o impacto de efeito de bola de neve que teria. Mais todo o lado humano envolvente. Claramente que quando as pessoas percebem que podem contribuir ajudando e, se isso se dissemina, é uma pratica que tem uma força brutal. Porque sentimos toda a lógica, toda a razão de toda essa força que se vai criando. E isso envolve muito as pessoas.

As pessoas passam a vida a ver esses casos, enquanto engordam frente a uma televisão. À espera que um político ou um D. Sebastião resolva esses problemas. Aqui as pessoas sentem que foram lá e fizeram e isso é uma mensagem social muito forte que pode levar as pessoas a deixarem de ser tão passivas. A perceberam que: “Espera lá, mas eu posso fazer algo…” Mesmo fora do âmbito social, mas no dia-a-dia, nos seus trabalhos, na sua freguesia.. Até o País pode ganhar, de uma forma global, com isso.
Tal e qual. Acreditamos que, se esse clique fosse sentido, seria muito mais fácil para todos.
Num dia conseguimos avançar 3 ou 4 anos no projecto de recuperação desta aldeia. Imaginem o que se podia conseguir noutras aldeias por este país fora…