Ser de Portugal

Tiago Pires – i surf because, on  youtube

Foi esta a frase escolhida por Tiago Pires para uma campanha numa das provas mais importantes do campeonato da elite de surf mundial, (32 surfistas) WCT. Uns disseram que surfavam pelo facto de ser uma das únicas coisas na vida que muda todos os dias, outros por.. etc.. O “Saca” escolheu, como principal razão, a nação que traz consigo para cada prova. Chamam-lhe o tigre português pela força, garra com que chegou onde está. Mas, também, é admirado por todos que, de forma unânime, o descrevem como “such a great guy”, com valores humanos admiráveis. Numa modalidade onde a vida é realmente colocada em risco. Onde por vezes, se surfa em sítios onde podemos perder a vida ou ficar fisicamente incapacitados. Ele começa esta promo dizendo que sempre foi difícil para ele, principalmente sendo o único português a integrar a elite internacional de Surf. Está, neste momento, em 14.º lugar neste ranking e tem tido uma carreira fenomenal. Num desporto que conta com muito pouco apoio do estado. Num desporto que tem um impacto, cada vez mais importante, na economia nacional, tendo sido criado um capítulo especial num estudo sobre a economia do mar. Turismo, escolas de surf, roupa, milhões de euros associados a este, mais do que desporto, considerado um estilo de vida. Estilo de vida porque, alem do cliché, que possa parecer, influencia a forma de estar da pessoa, muito além do desporto em si. Seja nas escolhas profissionais, no dia-a-dia, nas viagens que faz, etc.. Tudo isto em multiplicação acentuada.
Fiquei arrepiado a primeira vez que vi essa promo. Tanto pelo meu lado de fã dele, como por ser português. Perdoem-me o romantismo. Primeiro: tudo acontece no mar. Segundo: é preciso, mesmo, coragem física e psicologia para o fazer. Terceiro: está literalmente a percorrer o Mundo com a bandeira portuguesa às costas.
Veio-me a questão do patriotismo à cabeça.  Das mil e uma formas de o sermos e de o não sermos. Pegando num exemplo muito simples: apanhar uma garrafa de vidro que está no chão de uma rua. Quantos milhares de pessoas a ignoram pelo facto de ter sido outra pessoa a fazê-lo? Quando essa rua também é nossa, quando essa garrafa terá inevitavelmente custos para o estado ou para a degradação desse espaço. Esse espaço que é “nosso”. Que poderá ter um turista que passe por lá uma primeira e… última vez. Porque atrás de uma garrafa vêm mais duas, e com sujidade das ruas temos menos circulação, menos pessoas, insegurança e por aí fora. Claro que o me interessa aqui nem é a garrafa, é o sentimento que está por trás deste exemplo. Farto-me de ver estrangeiros a apanharem lixo voluntariamente nas praias, muito raramente vejo portugueses. Lembrei-me do futebol. Nunca segui bola nacional, mas sigo os jogos da selecção com toda a minha voz. Mas não posso deixar de questionar se o carrinho de compras daquele grupo com a cara pintada e a t-shirt da selecção portuguesa tem, ao lado da palete de cervejas, fruta que foi comprada tendo em conta a origem dela. Seria portuguesa? Existem tantas formas de sermos patriotas,  no trabalho, na rua, na cidadania. No orgulho, pelo melhor e pior. Na coerência nos maus e nos bons momentos. E lembrei-me das derrotas e vitórias, do doce e do amargo em torno da selecção. Das expectativas, das desilusões, das polémicas em torno de Portugal (selecção). Da paixão, da raiva, das lágrimas, da união, de toda a alma e energia usadas. Porque não é tudo isto disparado mais vezes? Porque sai a bandeira da gaveta praticamente só quando há jogos da bola? E lembrei-me do Saca e  do orgulho que ele tem em ser português, na paixão que tem por Portugal. Desse orgulho inabalável com bons ou maus resultados nos heats dele. Sempre que regressa a Portugal, a primeira frase é “é tão bom estar de volta a casa”. Os heats vão e vêm, os jogos começam e acabam.  A casa… está sempre lá.

MIguel F. Meneses