Nuvens de Pó – E depois dos festivais?

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Há quem goste de festivais e o último editorial deste jornal mostra-nos isso! Confesso: o meu nirvana não passa por me atolar em pó e gente num dos muitos festivais deste verão. Confesso: a minha praia favorita perto de Lisboa é o Meco. Porém, não fiz parte dos 90 mil que aí rumaram para, entre nuvens de pó, longas filas de espera para o wc e mais de 2 horas para regressar ao carro, foram ouvir Slash, Portishead ou Arcade Fire. O festival Super Bock Super Rock garantirá certamente muita diversão mas não a suficiente para me fazer ir até ele. Prefiro mil vezes perder-me na multidão do Hogmanay de Edimburgo, empoeirar-me no deserto de Siwa, acampar nas praias de Goa, estar na fila para entrar no Prado ou MOMA e ir a casas de banho sujas e decadentes na Índia. Desculpem-me os amantes de festivais. Mas gostos não se discutem e eu tento anestesiar-me de outras formas.
Os muitos festivais de verão vieram para ficar e parecem satisfazer uma população sedenta de concertos que tem, assim, a oportunidade de ver de perto grandes nomes da música comercial. E a lista foi de peso: os Coldplay e os Foo Fighters no Optimus Alive, , Seal e os Xutos no Cool Jazz Fest, os Nouvelle Vague e Maria Gadú no Delta Tejo, os Portishead, os Arcade Fire, os Arctic Monkeys no Super Bock, Super Rock, os Manu Chao e Mika no Marés Vivas sem esquecer os Crystal Castles em Paredes de Coura ou os nossos Deolinda no Sudoeste. É claro que um festival é sempre especial e pode proporcionar grandes momentos a quem conseguir recordar-se do que ouviu… Também eu assisti de perto a grandes nomes da cena musical embora agora tenha definitivamente optado por concertos mais intimistas…
Após esta fúria de verão, é hora de voltar à vida comum e aproveitar o que espaços como o Parque das Nações têm para dar. Para além do verde e do azul que nos rodeiam, apetecia-me poder usufruir de alguns espaços noturnos de qualidade, onde pudesse ouvir boa música ao fim da tarde ou beber um copo noite fora sem ser atropelada por grupos de teenagers de bairros próximos ou pelas multidões que procuram o casino.
É um facto que o Parque das Nações sofre de vários males e a falta de sítios noturnos de qualidade é um deles. Mas não é o único! Vivo no Parque das Nações desde a Expo 98 e recordo com saudade os primeiros anos em que aqui vivi, quando não havia trânsito desordenado, carros estacionados nos passeios, cocó de cão por todo o lado, nem corridas disto e daquilo e do outro… É verdade! Vim viver para o Parque das Nações ainda durante a Exposição Universal porque percebi, na altura, que este era o melhor sítio de Lisboa para se viver. Vi nascer a Escola Vasco da Gama, assisti da minha janela ao primeiro dia de aulas daqueles meninos e meninas e durante algum tempo, fui a segunda habitante do meu prédio.
À medida que os anos passaram e os prédios cresceram como cerejas, a qualidade de vida alterou-se radicalmente. É um facto que só consigo estar aqui calmamente durante os dias úteis porque, ao fim-de-semana, torna-se quase impossível sair à rua em paz. Especialmente se há alguma exposição na FIL, quando os carros se amontoam em cima dos passeios e este lado do parque fica praticamente intransitável. A situação agrava-se ainda mais quando a zona norte é sistematicamente escolhida para a realização de corridas disto e daquilo e até do outro, em que centenas de seres de ar infeliz correm sem qualquer objectivo, obrigando ao encerramento da rua onde vivo. Tudo até seria aceitável se ao menos respeitassem quem aqui vive… Não podiam ao menos abolir os bombos que nos acordam ao Domingo às 9h da manhã? Ou os seres que gritam nos megafones? Talvez não fosse má ideia deixarem-me dormir em paz…
Se eu quisesse barulho e confusão teria simplesmente ido aos concertos deste verão!

Carmo Miranda Machado escreve ao abrigo do novo acordo ortográfico.